Um retorno preparado por quem ficou

O governador Jarbas Vasconcelos, o senador Roberto Freire e o ex-ministro da Justiça Fernando Lyra, junto com outros menos renomados, são algumas das pessoas que não saíram de Pernambuco e dedicaram-se, durante os anos da ditadura, à luta para garantir a volta dos exilados

Tereza Rozowykwiat
Da equipe do DIARIO

 

Recuperados do choque inicial da violência da ditadura militar, políticos e parentes de presos, de exilados e militantes clandestinos começaram a sonhar com uma anistia que devolvesse ao Brasil a liberdade e a democracia. O sonho transformou-se em luta, no início tímida e proibida, que depois ganhou as ruas e tornou-se uma exigência nacional. Na opinião dos que a princípio participavam de secretas reuniões e que, com o passar do tempo, passaram a organizar comitês e manifestações de massa, a anistia foi conquistada graças à mobilização da sociedade e à exaustão do modelo repressivo dos militares. Ela veio quinze anos depois do golpe de 64. Não foi "ampla, geral e irrestrita", como desejavam os militantes de esquerda. Foi "lenta, gradual e segura", como permitiram os militares. Mas de toda forma, mudou a cena política brasileira e acelerou o processo de redemocratização.

Para o governador Jarbas Vasconcelos (PMDB), um dos principais integrantes do movimento pela anistia, a grande dificuldade enfrentada, no começo, foi a censura à Imprensa. Na época, era proibido falar em anistia e a recomendação era substituir a palavra por "revisão de processos políticos". Segundo Jarbas "na medida em que a ditadura ia se exaurindo, a censura era atenuada e a anistia tornava-se uma palavra-chave, uma bandeira que ganhou o País inteiro".

O governador lembra que o processo de conquista da anistia foi ameaçado pouco antes da assinatura da lei, por volta do mês de julho, quando os governistas decidiram excluir Miguel Arraes, Leonel Brizola e Francisco Julião dos benefícios da medida. A reação dos peemedebistas foi violenta, levando o Governo a recuar e a desistir de apresentar a proposta.

Jarbas só acreditou na anistia quando a lei foi assinada. Mas no dia 28 de agosto de 79, o então presidente do PMDB não pode comemorar. Acometido por uma mielite, séria doença neurológica. Somente no início de setembro pode retomar suas atividades, passando a cuidar dos preparativos para a chegada de Miguel Arraes (PSB), hoje seu principal inimigo político.

Tão atuante quanto Jarbas foi o hoje senador Roberto Freire (PPS), que na época era membro da comissão mista do Congresso que analisava o projeto da anistia e integrante do Partido Comunista Brasileiro. Ele lembra que a primeira vez que a tese da anistia foi assumida publicamente foi em 1971, no encontro nacional do MDB, realizado em Pernambuco e só em 1974 ganhou corpo.

Para Roberto Freire, um momento decisivo foi a votação da emenda Djalma Marinho, que tornava a anistia "ampla, geral e irrestrita". Os oposicionistas perderam por apenas quatro votos, o que representava uma grande demonstração de força, já que este placar foi possível graças aos votos da Arena, que possuía 120 deputados a mais que o MDB. "Nesse dia, eu vi que estava próxima a derrota da ditadura", declara o senador.

Já o ex-ministro da Justiça, Fernando Lyra (PPS), além de ter lutado pela volta dos exilados, contribuiu para ampliar o processo de redemocratização quando, ao assumir o Ministério, no início do Governo Sarney, conseguiu legalizar os partidos comunistas, que até então continuavam clandestinos, e remover parte do entulho autoritário.

Fernando Lyra confessa que apesar do impulso que a campanha da anistia ganhou a partir de 74, houve um momento, em 77, em que tudo parecia retroceder com o fechamento do Congresso e a edição do Pacote de Abril, com a instituição dos senadores biônicos. "A luta política arrefeceu, inicialmente. Mas no instante seguinte, verificou-se um impulso novo, como se o pacote tivesse servido para despertar as consciências", diz Lyra.

 

Matéria do jornal O Diário de Pernambuco – 28/09/99.