Drible na
falta de dinheiro
Aos 63 anos,
Aybirê Ferreira de Sá é uma sombra do homem que se desligou das Ligas
Camponesas e rompeu com Julião por considerá-lo "moderado demais". No
início da década de 60, ele queria iniciar uma guerrilha na Zona da Mata,
queimando canaviais e enfrentando os jagunços dos usineiros. Além de não ter
feito a reforma agrária no Nordeste e de ter perdido os dentes por causa de uma
infecção, hoje amarga a humilhação de sobreviver às custas da filha, que divide
com os pais os R$ 500,00 que recebe como professora de digitação em dois
empregos.
Poeta, consegue
alguns trocados vendendo folhetos de cordel da sua autoria entre os amigos e
esquerdistas que tiveram mais sorte ou esperteza. Conversando com amigos ou
sendo entrevistado, Aybirê fala das torturas que sofreu na prisão sem
demonstrar emoção: "Me botaram no pau-de-arara, me deram choques e muita
pancada". E só. Pagando R$ 3,00 por um livrinho de poemas, o interlocutor
poderá conhecer a dor que o velho militante ainda sente: "O ferro de
marcar boi/É paraas almas ferrar".
Depois da
anistia, deixou um emprego no Rio Grande do Sul, onde vivia clandestinamente, e
voltou para o Pernambuco. Há 20 anos no Recife, trabalhou durante algum tempo
na Imperial Diesel. A partir daí, começou a travar sua luta contra a
burocracia. "Tô esperando o final do meu processo que tá parado há uns
três anos. Da última vez que liguei, uma das moças me disse que eu tinha
esquecido de reconhecer firma num documento". Enquanto a aposentadoria não
sai, Aybirê dribla a Celpe, que teima em cortar a luz. (I.F.)
Matéria do jornal O Diário de Pernambuco
– 28/09/99.