15/08/99

Vinte Anos de Anistia

 Cesar Teixeira

 

A luta pela anistia política no Brasil não foi uma tarefa fácil para os setores progressistas que empunharam essa bandeira. Na realidade, segundo o Instituto Teotônio Vilela (DF), a primeira pessoa a tocar no assunto depois do golpe militar foi o escritor Tristão de Athayde, que, em dezembro de 1964, durante um programa de rádio no Rio de Janeiro, dirigiu ao presidente Castelo Branco um apelo em favor da anistia política. Em 1972, o MDB, na época o único “partido de oposição” (o outro era a Arena, dos governistas), decidiu defender no seu programa eleições livres, constituinte e anistia, com restrições às pessoas envolvidas em guerrilhas, seqüestros e assaltos a banco.

Em 1974, é criado em São Paulo pela Drª Terezinha Zerbini, da OAB regional, o Movimento Feminino pela Anistia, e surgem comitês pró-anistia em vários estados, além de países onde haviam brasileiros exilados. Surge, em 1978, o Comitê Brasileiro pela Anistia, por iniciativa da carioca Iramaya Benjamin, mãe de dois filhos exilados. O CBA visava a articulação e coordenação do movimento a nível nacional, tendo à frente o senador Teotônio Vilela e os deputados Roberto Freire e João Gilberto Lucas Coelho, entre outros, que realizaram um levantamento minucioso da situação dos presos políticos, viajando por vários estados.

A partir daí, a pressão social obrigou o governo do general João Baptista Figueiredo a ceder, revisando os inquéritos e processos de cassação e condenação de políticos, para depois encaminhar um projeto de Lei de Anistia ao Congresso Nacional, tendo como negociador o Ministro da Justiça, Petrônio Portela. Foi então constituída uma Comissão Mista no Congresso para examinar e dar parecer sobre o projeto de anistia política, tendo Teotônio Vilela como presidente e Ernani Satyro como relator, em meio a um clima de debates calorosos e situações delicadas como as greves de fome de presos políticos.

Finalmente, a Lei de Anistia foi aprovada em 18 de agosto e promulgada no dia 28 do mesmo mês. Centenas de exilados voltaram aos Brasil e milhares saíram da clandestinidade, enquanto outros puderam voltar à cena política nacional, com o surgimento de novos partidos e a reabilitação dos que haviam sido expurgados. Pressões de familiares dos presos políticos desaparecidos junto ao governo FHC conquistaram, através da Lei 9.140/95, o reconhecimento de que, na verdade, seus parentes haviam sido assassinados.

A muito custo, algumas famílias receberam indenizações, ao serem confirmadas as mortes de seus parentes em câmaras de tortura, nas ruas, nos aparelhos clandestinos, nas prisões e nas matas.

No entanto, apesar da Lei de Anistia, muitas pessoas que haviam sido presas, ou que foram aposentadas compulsoriamente, não puderam voltar aos seus postos ou terem reconhecidas a sua anistia, sobretudo depois da criação da Comissão de Anistia pelo Decreto nº 1.500, de 24/05/95, e da promulgação do Decreto Presidencial nº 2.172, de 05/03/97, que, além de desrespeitar a Constituição, impõem aos ex-condenados, por exemplo, a certidão do SAI (ex-SNI), para que possam ser reconhecidos como anistiados.

Conforme denúncia da advogada Paula Sapir Febrot e do jornalista Paulo Cannabrava Filho, membros do Conselho Diretivo da ABRAP (Associação Brasileira dos Anistiados Políticos) de São Paulo, essa Comissão, ligada ao Ministério do Trabalho, desde que foi criada até dezembro de 1998, reunindo-se uma vez por mês, “não conseguiu declarar a anistia de mais de cinco cidadãos por reunião, sendo que há processos que estão tramitando há mais de cinco anos”.

Nunca entendemos – dizem os denunciantes – o motivo pelo qual a Comissão de Anistia funciona no Ministério do Trabalho e não no Ministério da Justiça ou na Secretaria dos Direitos Humanos, “tampouco entendemos porque o anistiado deve provar, com farta e difícil documentação, que foi perseguido e posteriormente anistiado precisamente a quem o perseguiu e o anistiou”.

Acrescentam ainda que desde janeiro do corrente a Comissão de Anistia está sem presidente. Significa que há oito meses não há reconhecimento de anistiados, o que demonstra a intenção do Governo Federal de impedir a Aposentadoria Excepcional de Anistiado através do INSS, ainda que grande parte desses anistiados apresentem graves seqüelas físicas e psíquicas, sem condições de refazer suas vidas. No entanto, o próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso é beneficiário da aposentadoria propiciada pela Lei de Anistia.

Tanto a morosidade da Comissão, quanto a discriminação das autoridades, fizeram do governo FHC o que menos reconheceu anistias, desde o tempo de Sarney (veja quadro). Para piorar a situação, recentemente, no Diário Oficial da União de 08/06/99, foi publicada a Ordem de Serviço nº 623, de 07/05/99, da Diretoria do Seguro Social da Previdência, assinada por Ramon Eduardo Barros Barreto, que diz textualmente que, a partir dessa data, “fica extinta a aposentadoria excepcional de Anistiado”.

GOVERNOS

ANISTIAS RECONHECIDAS

José Sarney

627

Fernando Collor

183

Itamar Franco

896

Fernando Henrique Cardoso

60

Fonte: Abap - São Paulo